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Para comemorar o segundo aniversário do nosso bloguinho, os adultos estão participando de um desafio: " Nossa querida Cecília escreveu uma crônica chamada 'Casas Amáveis". Leia essa crônica e faça um depoimento sobre a casa que marcou a sua história. Se o seu depoimento for o escolhido por nossa comissão julgadora, você ganhará um livro da Cecília no dia 24 de abril."
Conheça as histórias que já chegaram:
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MEMÓRIAS DA CASA DE INFÂNCIA
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Numa vila... bem pequena. Numa rua... das poucas a mais povoada de casas. Numa quadra... a dos velhos casarões. Num terreno... grande, ladeado de árvores ornamentais e frutíferas. Lá estava ela, a minha casa, aquela de onde guardo nos recônditos de minha memória, as mais ternas lembranças da minha infância. Era uma casa imponente, não pela beleza, nem pelo tamanho, mas pela cor. Lembro-me que meu pai, depois de uma chuva de pedra que pontilhou sua pintura, pintou-a numa cor verde água, chamava a atenção.
De arquitetura italiana, a velha casa tinha um porão que servia para guardar mantimentos, estoque das safras de feijão, arroz e milho que meu pai colhia, era também um depósito de quinquilharias de minha mãe... era o local preferido por mim e pela meninada da rua para brincar de “casinha”. Saíamos de lá espirrando, o local úmido provocava alergias, mas mesmo assim não deixávamos de brincar nele, acho que aquele amontoado de coisas e a penumbra por não ter janelas atiçava nossa imaginação.
Dois pés de pêra deram sabor e embalo aos meus sonhos de criança. Minhas tardes eram preenchidas com as brincadeiras na balança feita de cordas, e pelo sabor das frutas suculentas que escorriam pelo canto da boca a cada mordida.
Nos fundos e na frente da casa, duas áreas grandes, assim eram chamadas as varandas cercadas de madeira, naquela época. Lembro-me de quando meu pai mandou construir a primeira, uma das lembranças mais antigas que guardo. Enquanto os homens trabalhavam, eu, na parte já construída, desenhava com o lápis de pedreiro, acho que esses foram meus primeiros rabiscos e permaneceram ali durante muito tempo, na madeira branca da grande varanda, até que a chuva e o tempo aos poucos fossem fazendo com que desaparecesse.
Do lado da rua de cascalho, ficava o cartório onde meu pai trabalhava, ele era “entendente”, uma profissão em extinção, eram como eram chamados os administradores de vilas ainda não emancipadas, uma espécie de prefeito sem tanta pompa, e também onde cumpria com suas funções de escrivão. Essa era a parte da casa que eu mais curtia. Sentada numa cadeira estofada de rodinhas e com uma caneta e um livro na mão vivia meus momentos de adultisse precoce. O duro era agüentar seus sermões quando desaparecia alguma coisa. Quando ele me olhava com sua testa franzida e olhar sisudo eu já sabia do que se tratava.
Casa humilde, o banheiro ficava do lado de fora, chuveiro de água fria, os banhos no inverno, um teste de coragem. As vezes, quando em dias de frio intenso, minha mãe colocava água quente em uma banheira e a gente ficava feliz por poder tomar um banho mais demorado. Minha mãe, aliás era mestre nisso, ela sabia transformar as durezas da vida em verdadeiras lições de amor.
Os dias de vendavais e de chuva forte eram os mais temidos pela minha mãe, a casa velha de madeira ruía sob o alentado vento. Mas ela permaneceu firme por muito tempo ainda...
Até o dia em que foi demolida e cedeu lugar à uma casa mais moderna. Nesse tempo a gente já havia mudado. Fomos morar na cidade... meu pai construiu uma casa grande, bem mais confortável, mas que apesar disso, nunca trouxera o aconchego e a alegria da primeira, acho que as casas têm alma e a velha casa de porão, essa tinha uma alma iluminada.
Memórias nunca são fáceis. As vezes, transformadas em tristezas, noutras, em saudade...
Da velha casa de madeira, sobrou apenas um retrato na parede e as lembranças na minha mente que me trazem o gostinho e a saudade da minha infância. E aí, ela continua ainda linda, imponente, aconchegante, iluminada...
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Numa vila... bem pequena. Numa rua... das poucas a mais povoada de casas. Numa quadra... a dos velhos casarões. Num terreno... grande, ladeado de árvores ornamentais e frutíferas. Lá estava ela, a minha casa, aquela de onde guardo nos recônditos de minha memória, as mais ternas lembranças da minha infância. Era uma casa imponente, não pela beleza, nem pelo tamanho, mas pela cor. Lembro-me que meu pai, depois de uma chuva de pedra que pontilhou sua pintura, pintou-a numa cor verde água, chamava a atenção.
De arquitetura italiana, a velha casa tinha um porão que servia para guardar mantimentos, estoque das safras de feijão, arroz e milho que meu pai colhia, era também um depósito de quinquilharias de minha mãe... era o local preferido por mim e pela meninada da rua para brincar de “casinha”. Saíamos de lá espirrando, o local úmido provocava alergias, mas mesmo assim não deixávamos de brincar nele, acho que aquele amontoado de coisas e a penumbra por não ter janelas atiçava nossa imaginação.
Dois pés de pêra deram sabor e embalo aos meus sonhos de criança. Minhas tardes eram preenchidas com as brincadeiras na balança feita de cordas, e pelo sabor das frutas suculentas que escorriam pelo canto da boca a cada mordida.
Nos fundos e na frente da casa, duas áreas grandes, assim eram chamadas as varandas cercadas de madeira, naquela época. Lembro-me de quando meu pai mandou construir a primeira, uma das lembranças mais antigas que guardo. Enquanto os homens trabalhavam, eu, na parte já construída, desenhava com o lápis de pedreiro, acho que esses foram meus primeiros rabiscos e permaneceram ali durante muito tempo, na madeira branca da grande varanda, até que a chuva e o tempo aos poucos fossem fazendo com que desaparecesse.
Do lado da rua de cascalho, ficava o cartório onde meu pai trabalhava, ele era “entendente”, uma profissão em extinção, eram como eram chamados os administradores de vilas ainda não emancipadas, uma espécie de prefeito sem tanta pompa, e também onde cumpria com suas funções de escrivão. Essa era a parte da casa que eu mais curtia. Sentada numa cadeira estofada de rodinhas e com uma caneta e um livro na mão vivia meus momentos de adultisse precoce. O duro era agüentar seus sermões quando desaparecia alguma coisa. Quando ele me olhava com sua testa franzida e olhar sisudo eu já sabia do que se tratava.
Casa humilde, o banheiro ficava do lado de fora, chuveiro de água fria, os banhos no inverno, um teste de coragem. As vezes, quando em dias de frio intenso, minha mãe colocava água quente em uma banheira e a gente ficava feliz por poder tomar um banho mais demorado. Minha mãe, aliás era mestre nisso, ela sabia transformar as durezas da vida em verdadeiras lições de amor.
Os dias de vendavais e de chuva forte eram os mais temidos pela minha mãe, a casa velha de madeira ruía sob o alentado vento. Mas ela permaneceu firme por muito tempo ainda...
Até o dia em que foi demolida e cedeu lugar à uma casa mais moderna. Nesse tempo a gente já havia mudado. Fomos morar na cidade... meu pai construiu uma casa grande, bem mais confortável, mas que apesar disso, nunca trouxera o aconchego e a alegria da primeira, acho que as casas têm alma e a velha casa de porão, essa tinha uma alma iluminada.
Memórias nunca são fáceis. As vezes, transformadas em tristezas, noutras, em saudade...
Da velha casa de madeira, sobrou apenas um retrato na parede e as lembranças na minha mente que me trazem o gostinho e a saudade da minha infância. E aí, ela continua ainda linda, imponente, aconchegante, iluminada...
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O SOBRADINHO DAS PULGAS
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Em minha casa que não era minha, porque era alugada, e como menina de oito anos eu achava que aquilo era especial, principalmente, quando minha mãe preencheu a ficha na escola nova para a qual eu acabava de ser transferida junto com a mudança de casa. Enquanto a maioria das mães das crianças respondia “casa própria” à secretária da escola – a minha respondeu “alugada”. Talvez fosse por isso, pensava eu, porque era diferente das tais “casas próprias”, que aquele sobradinho que meus pais chamavam de moradia transitória, enquanto a casa nova não era construída, tivesse gosto de liberdade e brincadeiras de rua com os amigos novos. Depois de morar em um apartamento sem área de lazer até então, o sobradinho descorado de janelas de madeira velha pintadas de verde, da vila na rua arborizada com lindos jardins pareceu-me o paraíso... Nem me importei com o batalhão de pulgas que habitava o local e se recusava a sair de lá. Também não liguei para os tacos soltos, o chuveiro quebrado e os detestáveis banhos de caneca para economizar energia, e sequer reparei no esgoto que às vezes borbulhava pelo ralo da tenebrosa área de serviço, onde o piso de cimento e tudo o mais parecia ter mais de cem anos. Lembrei-me de meus livros de histórias de fadas e achei que tudo aquilo passaria se eu poderia transformá-lo em um sobradinho bonito, assim que eu descobrisse o segredo do poder das fadas. Para conseguir isso me faltava pouco... Teria que vender os convites para a próxima quermesse da escola para os vizinhos, e conseguir ganhar o prêmio: um livro de contos, que me revelaria a magia!
O tempo passou e as pulgas não se foram... A mudança para a casa em construção era sempre adiada. No entanto, eu vivia feliz, porque ganhara muitos amigos para brincar na pacata rua da vila, e também na sala de tacos soltos. O que importava para nós, as crianças, era a alegria que tínhamos em estar juntos e descobrir brincadeiras novas. A fada dos livros, de certa forma, me ensinou a magia para transformar o velho sobrado de janelas verdes capengas, na casa encantada com as janelas sempre abertas para a amizade.
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Madalena Barranco
Em minha casa que não era minha, porque era alugada, e como menina de oito anos eu achava que aquilo era especial, principalmente, quando minha mãe preencheu a ficha na escola nova para a qual eu acabava de ser transferida junto com a mudança de casa. Enquanto a maioria das mães das crianças respondia “casa própria” à secretária da escola – a minha respondeu “alugada”. Talvez fosse por isso, pensava eu, porque era diferente das tais “casas próprias”, que aquele sobradinho que meus pais chamavam de moradia transitória, enquanto a casa nova não era construída, tivesse gosto de liberdade e brincadeiras de rua com os amigos novos. Depois de morar em um apartamento sem área de lazer até então, o sobradinho descorado de janelas de madeira velha pintadas de verde, da vila na rua arborizada com lindos jardins pareceu-me o paraíso... Nem me importei com o batalhão de pulgas que habitava o local e se recusava a sair de lá. Também não liguei para os tacos soltos, o chuveiro quebrado e os detestáveis banhos de caneca para economizar energia, e sequer reparei no esgoto que às vezes borbulhava pelo ralo da tenebrosa área de serviço, onde o piso de cimento e tudo o mais parecia ter mais de cem anos. Lembrei-me de meus livros de histórias de fadas e achei que tudo aquilo passaria se eu poderia transformá-lo em um sobradinho bonito, assim que eu descobrisse o segredo do poder das fadas. Para conseguir isso me faltava pouco... Teria que vender os convites para a próxima quermesse da escola para os vizinhos, e conseguir ganhar o prêmio: um livro de contos, que me revelaria a magia!
O tempo passou e as pulgas não se foram... A mudança para a casa em construção era sempre adiada. No entanto, eu vivia feliz, porque ganhara muitos amigos para brincar na pacata rua da vila, e também na sala de tacos soltos. O que importava para nós, as crianças, era a alegria que tínhamos em estar juntos e descobrir brincadeiras novas. A fada dos livros, de certa forma, me ensinou a magia para transformar o velho sobrado de janelas verdes capengas, na casa encantada com as janelas sempre abertas para a amizade.
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Madalena Barranco
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Ah... a minha casa!
No alto do morro, onde se vê o céu, se ver o mar, lá estava ela...verde escura, um passeio onde brincava de amarelinha.Era a minha casa, pequena, aconchego, lar.
Nas noites de lua cheia sentávamos à porta para brincarmos sob a luz da lua. Dali via a cidade por cima, ouvia as músicas que vinham de longe, escutava a procissão que vinha da Catedral. Em meus sonhos de menina, minha casa era meu castelo, que ficava tão alto, tão alto, que só mesmo um príncipe encantado para chegar aqui...
O tempo foi passando, a casa foi modificando, ajeitando aqui, aumentando ali e hoje é uma casa imensa... Mas até hoje, quando sonho com o passado, é a casinha verde que se aconchega em minhas memórias. Saudades verdinhas...
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Era uma casa novinha, ainda não terminada, mas, como o dinheiro era pouco, entramos nela assim mesmo.
Fui acompanhando suas melhorias: um dia, as janelas de vidro, clarinhas e lindas; outro dia, o piso de cerâmica vitrificada, coloridos, acompanhando a cor das paredes, como tinha que ser naquela ocasião. Tudo bem colorido e alegre. Cada cômodo tinha seu brilho próprio. Aos poucos, a casa foi terminada. Aconchegante e feliz.
Mas meu tesouro era o quintal, com aquele barranco nos fundos, onde havia até uma caverna, que para mim, era imensa. Ali era meu castelo de princesa, minha oca de índia, meu salão de beleza, minha cozinha de onde saíam algumas comidinhas, que delícia!
Assim, vi o tempo passar e a casa transformar-se em saudade quando dela me mudei para minha própria casa; meu castelo encantadado onde sou uma rainha muito feliz ao lado do meu rei e de três lindos príncipes!
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Eliane
Eliane
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Eramos íntimos, embora eu menino, travesso e ela senhora, cansada pelo tempo, cheia de uma sabedoria que eu desconfiava vir pelas janelas tantas. Senhora ampla de aposentos feitos por mãos negras e puras, cercada por um pomar adocicado e com aroma que a mim na época, pareciam parar o tempo; na cozinha o fogão de lenha não tinha descanso, os quartos iluminados por lamparinas, e protegidos pela capela e pela serenidade que descia da serra.
Sim, éramos íntimos, embora ela tão maior que eu, tão secular e eu tão menino, sem perceber aprendia a cada dia, em cada som de cada aposento, os sentimentos diversos de que a vida era composta, alí fui feliz, fui menino, fui dono de meus sonhos, e ela protetora de meus medos e de minhas fantasias, ali o menino cresceu, só depois de muito tempo, eu homem maduro, e ela já sem vida, percebi que agradecer já não podia, a casa em que semeou no menino a semente da poesia.
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A casa que marcou minha história já não existe mais.
Na verdade não era uma casa e sim uma fazenda enorme. Tinha aproximadamente uns dezoito cômodos distribuídos na parte superior da construção, debaixo do assoalho eram guardadas ferramentas agrícolas, móveis antigos e muitas aranhas.
O chão era de madeira de lei, um dos crimes contra a natureza sobre os quais também temos nossa parcela de responsabilidade, mesmo que herdadas.
Era enorme, e como alguns diziam, mal assombrada. Nela viviam meus avós desde que se casaram. Haviam comprado de um fazendeiro escravocrata. Daí a fama das assombrações. Diziam que em noites enluaradas podia-se ouvir a lamúria dos escravos sendo açoitados. No entanto, apesar de assustador, este não é o motivo de minhas lembranças.
Quando nasci, os oito filhos já haviam partido e o movimento a fazenda se dava mesmo durante as férias quando tios, tias, primos e primas enchiam aquela imensidão de gritinhos, histórias, cheiros dos mais diversos pratos e principalmente alegria.
Nas “produções” culinárias da casa, especial destaque era dado aos doces: doce de goiaba e banana em calda ou em pedaços feitos em um enorme tacho de bronze, em uma fornalha no terreiro; doce de mamão verde ralado, feito no fogão a lenha (fogão a gás nem pensar); mingau de milho verde com canela em pó; e a rapadura produzida por meu avô em um antigo engenho.
Minha avó guardava tudo isto, a sete chaves, em um quarto localizado no centro da casa, sem janelas, e por isto batizado de “Quarto Escuro”. Trancava para que pudéssemos comer aos poucos, sem passar por nenhum desconforto intestinal, creio eu. De qualquer forma, no “Quarto Escuro” estavam localizados os desejos mais saborosos de todos os netos que eram presenteados aos bocados.
As brincadeiras (cabra cega, casinha, bonecas de milho, pique, queimada); as frutas (coco, coquinho, lima, mamão, laranja serra d’água, banana, mexerica); as pescarias, onde o mais emocionante era a caça às minhocas; e a divertida aventura nas enxurradas pós chuvas de verão, tenho certeza, permanecerão nas lembranças de todos.
Mas, o que toca o coração e às vezes traz um sentimento nostálgico, é a lembrança do som que o chinelo do meu avô produzia quando era arrastado pelas madeiras do assoalho. Este som, naqueles tempos, nos trazia um medo “gostoso” que fazia com que todos se acomodassem em suas camas e brevemente encontrassem o sono. Hoje pode ter se tornado o símbolo de uma família que tinha muito respeito, carinho e amor por seus criadores.
Infelizmente, nossa casa foi demolida quando vendida, logo após a morte de meus avós, sob o olhar pesaroso dos filhos. Mesmo assim, seu bem maior, a magia que encantou a cada um de nós estará sempre guardada em nossos corações.
Na verdade não era uma casa e sim uma fazenda enorme. Tinha aproximadamente uns dezoito cômodos distribuídos na parte superior da construção, debaixo do assoalho eram guardadas ferramentas agrícolas, móveis antigos e muitas aranhas.
O chão era de madeira de lei, um dos crimes contra a natureza sobre os quais também temos nossa parcela de responsabilidade, mesmo que herdadas.
Era enorme, e como alguns diziam, mal assombrada. Nela viviam meus avós desde que se casaram. Haviam comprado de um fazendeiro escravocrata. Daí a fama das assombrações. Diziam que em noites enluaradas podia-se ouvir a lamúria dos escravos sendo açoitados. No entanto, apesar de assustador, este não é o motivo de minhas lembranças.
Quando nasci, os oito filhos já haviam partido e o movimento a fazenda se dava mesmo durante as férias quando tios, tias, primos e primas enchiam aquela imensidão de gritinhos, histórias, cheiros dos mais diversos pratos e principalmente alegria.
Nas “produções” culinárias da casa, especial destaque era dado aos doces: doce de goiaba e banana em calda ou em pedaços feitos em um enorme tacho de bronze, em uma fornalha no terreiro; doce de mamão verde ralado, feito no fogão a lenha (fogão a gás nem pensar); mingau de milho verde com canela em pó; e a rapadura produzida por meu avô em um antigo engenho.
Minha avó guardava tudo isto, a sete chaves, em um quarto localizado no centro da casa, sem janelas, e por isto batizado de “Quarto Escuro”. Trancava para que pudéssemos comer aos poucos, sem passar por nenhum desconforto intestinal, creio eu. De qualquer forma, no “Quarto Escuro” estavam localizados os desejos mais saborosos de todos os netos que eram presenteados aos bocados.
As brincadeiras (cabra cega, casinha, bonecas de milho, pique, queimada); as frutas (coco, coquinho, lima, mamão, laranja serra d’água, banana, mexerica); as pescarias, onde o mais emocionante era a caça às minhocas; e a divertida aventura nas enxurradas pós chuvas de verão, tenho certeza, permanecerão nas lembranças de todos.
Mas, o que toca o coração e às vezes traz um sentimento nostálgico, é a lembrança do som que o chinelo do meu avô produzia quando era arrastado pelas madeiras do assoalho. Este som, naqueles tempos, nos trazia um medo “gostoso” que fazia com que todos se acomodassem em suas camas e brevemente encontrassem o sono. Hoje pode ter se tornado o símbolo de uma família que tinha muito respeito, carinho e amor por seus criadores.
Infelizmente, nossa casa foi demolida quando vendida, logo após a morte de meus avós, sob o olhar pesaroso dos filhos. Mesmo assim, seu bem maior, a magia que encantou a cada um de nós estará sempre guardada em nossos corações.
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MINHA CASA CONTA HISTÓRIAS
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A casa está lá, viva.
Poucas mudanças. Mamãe, com quase oitenta anos, nos esperando com seu sorriso fácil, comida e ladainha nordestinas.
Tinha um ano quando mudei para a nossa casa. Não precisava de muros, os vizinhos tomavam conta uns dos outros. Na varanda, ouvia histórias, à noite, deitada na rede e olhando para as lagartixas. No quintal, o tronco do abacateiro virava janela e a goiabeira sofria com o balanço e meus sonhos de trapezista. Coqueiro, mangueira, mamoeiro, bananeira, antúrios, samambaias, onze-horas, roseiras, muitos sabores e cores. Oh, deu bem-me-quer!
Galinhas, só para comer os ovos, tínhamos pena de matá-las. Um dia a cabra pariu e fui proibida de assistir. O gato Mamão sumiu e virou tamborim. Nunca mais quis saber desses ingratos. Vários cachorros, todos muito queridos. Tristão e Isolda,o casal de periquitos; Tancredo e Risoleta, os cágados. Isto é uma casa ou um sítio?
Lembro-me do vovô sentado perto da cristaleira, quando veio nos visitar, e dos longos cabelos da vovó Amélia. Compraram uma máquina de costura para minha mãe trabalhar e uma cadeira de balanço para mim. Veio se despedir, foi-se na Semana Santa, antes da cegonha chegar com minha irmã. Parecia uma índia! A fralda de tecido branco luzia em sua morenice.
As brincadeiras eram muitas; os brinquedos, poucos. Tenho o Tonico e a Melindrosa até hoje. Quero uma neta.
A primeira televisão foi a nossa festa e da vizinhança. Casa cheia para assistir às novelas e ao programa do Bolinha.
Meu pai era um construtor de idéias. A ambulância levou seus silêncios e sonhos. Sua bênção, pai. Deus te abençõe, minha filha. Nossas últimas palavras.
Festa junina, formatura, aniversário, casamento, nascimento... Tantas lembranças.
As borboletas sumiram, mas os passarinhos ainda cantam e as maritacas anunciam sua chegada.
O jasmineiro ainda perfuma a noite. Onde estão aos vagalumes?
Cada canto guarda seus segredos, sorrisos e lágrimas.
Há mistérios por desvendar.
Minha casa conta muitas histórias para quem quiser ouvir e sonhar.
A casa está lá, viva.
Poucas mudanças. Mamãe, com quase oitenta anos, nos esperando com seu sorriso fácil, comida e ladainha nordestinas.
Tinha um ano quando mudei para a nossa casa. Não precisava de muros, os vizinhos tomavam conta uns dos outros. Na varanda, ouvia histórias, à noite, deitada na rede e olhando para as lagartixas. No quintal, o tronco do abacateiro virava janela e a goiabeira sofria com o balanço e meus sonhos de trapezista. Coqueiro, mangueira, mamoeiro, bananeira, antúrios, samambaias, onze-horas, roseiras, muitos sabores e cores. Oh, deu bem-me-quer!
Galinhas, só para comer os ovos, tínhamos pena de matá-las. Um dia a cabra pariu e fui proibida de assistir. O gato Mamão sumiu e virou tamborim. Nunca mais quis saber desses ingratos. Vários cachorros, todos muito queridos. Tristão e Isolda,o casal de periquitos; Tancredo e Risoleta, os cágados. Isto é uma casa ou um sítio?
Lembro-me do vovô sentado perto da cristaleira, quando veio nos visitar, e dos longos cabelos da vovó Amélia. Compraram uma máquina de costura para minha mãe trabalhar e uma cadeira de balanço para mim. Veio se despedir, foi-se na Semana Santa, antes da cegonha chegar com minha irmã. Parecia uma índia! A fralda de tecido branco luzia em sua morenice.
As brincadeiras eram muitas; os brinquedos, poucos. Tenho o Tonico e a Melindrosa até hoje. Quero uma neta.
A primeira televisão foi a nossa festa e da vizinhança. Casa cheia para assistir às novelas e ao programa do Bolinha.
Meu pai era um construtor de idéias. A ambulância levou seus silêncios e sonhos. Sua bênção, pai. Deus te abençõe, minha filha. Nossas últimas palavras.
Festa junina, formatura, aniversário, casamento, nascimento... Tantas lembranças.
As borboletas sumiram, mas os passarinhos ainda cantam e as maritacas anunciam sua chegada.
O jasmineiro ainda perfuma a noite. Onde estão aos vagalumes?
Cada canto guarda seus segredos, sorrisos e lágrimas.
Há mistérios por desvendar.
Minha casa conta muitas histórias para quem quiser ouvir e sonhar.
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A MINHA CASA
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Minha casa tem muitas cores. Quando estou triste, fica meio acinzentada, meio pálida. Mas se chega algum amigo, logo se pinta de amarelo ouro, da cor do sol de verão!
Minha casa é pequena, quando os cachorros querem entrar e as crianças querem sair! Mas ás vezes é tão grande, quando só estou.
Minha casa é barulhenta, quando escuto minhas músicas, mas só gosto quando alguém me pede para baixar o volume. Qual graça há em escutar som alto sozinha?
Minha casa é luxuosa, quando famintos nos sentamos á mesa e Deus nos brinda com delicioso alimento! Minha casa é tão pobrezinha, quando abro a geladeira e penso se vou comer, pois hoje ninguém virá para almoçar...
Minha casa tem playground durante o dia, em dia chuvoso, quando sofá vira parquinho, e á noite, já bem tarde, vira poltrona de cinema, para namorar juntinho!
Minha casa é palácio, é mansão e é casebre, palafita ou barraco. Só não pode deixar nunca de ser sempre meu refúgio, meu sossego, minha bagunça, pois sem ela não me acho e sem ela não existo.
Minha casa é qualquer uma, onde tenha um amigo, um irmão ou um amor. É onde me sinto bem, onde encontro calor, pois já estive em mansão, de muito luxo e desamor, e por isso, hoje em dia, minha casa tem várias formas, de acordo com meu humor!
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NA CASA QUE MOREI HAVIA UMA SALA DE AULA
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Ainda me lembro que meu pai ensinava dentro de casa, na varanda...
Eu tinha quatro anos... Havia palmatória e também castigo de joelhos para quem não o obedecesse ou não cumprisse com as obrigações de estudante (1962). A cidade chama-se Poço Verde, e o lugarejo, “Lagoa de Cima”. O nome Lagoa de Cima foi dado porque a casa ficava ao lado de uma lagoa (um pequeno açude chamado lagoa). Hoje nem há mais lagoa...
Foi nesse lugar que nasci e morei até os meus quatro anos de idade. Portanto, são poucas as lembranças... Fiquei adulta e voltei para ver a casa onde nasci, mas, a lagoa, que parecia tão grande, agora nem existe mais! Lembro que havia peixes e plantas verdes. Ainda tenho a nítida lembrança do meu pai preparando a rede para pescar naquela lagoa. Ele pescava muitas traíras e piabas. Lembro também do pé de umbu que ficava ao lado da porteira que dava para a lagoa. Foi por essa porteira que certo dia presenciei um passeio de cobra. A cobra ia atravessando o caminho que dava para a lagoa... Talvez eu fosse muito baixinha para comparar o tamanho da cobra, que era ENORME! A cobra era tão grande que, enquanto atravessava o caminho, eu não podia ver onde encerrava sua cauda... Dizem que o nome daquela cobra era “papa-pinto”, porque ela gostava de comer os pintinhos das galinhas ainda dentro dos ovos chocados.
Bem, a casa era uma espécie de lingüiça, começava com o pé-direito, depois tinha a varanda (sala de aula), a sala de visitas, a despensa ou casa de farinha, um corredor com três quartos, um ao lado do outro. No corredor também havia uma espécie de “hall’, onde ficavam instalados os potes para tomar água. Não havia água potável e nem tampouco, água encanada! A água que tomávamos era a mesma água da lagoa. Na casa, havia mais uma sala de estar, mais um quarto, a cozinha com fogão à lenha e o banheiro, que era uma casinha do lado externo. Também do lado externo da casa ficavam o galinheiro, o chiqueiro, o curral e um galpão para guardar milho, feijão e mandioca. Havia uma plantação enorme de cactus! Esses serviam de alimento para os animais. Só que me disseram que na época de muita seca, as pessoas tomavam o líquido do cactus! Acho isso impressionante! Do lado oposto à plantação de cactus, ficavam o lago e as demais plantações. No quintal da casa, havia um enorme pé de primavera no qual eu brincava de casinha com a minha prima Iracy. Também havia um pé de açucena (planta da família das Amarílis). Essa açucena dava uma flor branca e azul, linda! Dizem que ali eram enterrados os cordões umbilicais dos meus irmãzinhos. Onze faleceram logo ao nascer! Eu sobrevivi para contar essa estória! O meu cordão umbilical também ficou no pé de açucena. Isso acontecia porque não havia maternidade na região. As crianças nasciam em casa mesmo, a enfermeira era uma parteira... As açucenas floriam mais ou menos no inverno e ficavam por um bom tempo. Depois só floriam novamente no ano seguinte. Incrível! Quem cuidava do jardim e das açucenas era uma das minhas irmãs, a Maria da Glória. Ela adora cuidar de plantas até hoje! Tanto é, que o jardim da sua casa é bem parecido com o jardim da Lagoa de Cima... Hoje da Lagoa de cima tenho apenas a foto do pé de umbu. A casa só existe na minha lembrança.
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Ainda me lembro que meu pai ensinava dentro de casa, na varanda...
Eu tinha quatro anos... Havia palmatória e também castigo de joelhos para quem não o obedecesse ou não cumprisse com as obrigações de estudante (1962). A cidade chama-se Poço Verde, e o lugarejo, “Lagoa de Cima”. O nome Lagoa de Cima foi dado porque a casa ficava ao lado de uma lagoa (um pequeno açude chamado lagoa). Hoje nem há mais lagoa...
Foi nesse lugar que nasci e morei até os meus quatro anos de idade. Portanto, são poucas as lembranças... Fiquei adulta e voltei para ver a casa onde nasci, mas, a lagoa, que parecia tão grande, agora nem existe mais! Lembro que havia peixes e plantas verdes. Ainda tenho a nítida lembrança do meu pai preparando a rede para pescar naquela lagoa. Ele pescava muitas traíras e piabas. Lembro também do pé de umbu que ficava ao lado da porteira que dava para a lagoa. Foi por essa porteira que certo dia presenciei um passeio de cobra. A cobra ia atravessando o caminho que dava para a lagoa... Talvez eu fosse muito baixinha para comparar o tamanho da cobra, que era ENORME! A cobra era tão grande que, enquanto atravessava o caminho, eu não podia ver onde encerrava sua cauda... Dizem que o nome daquela cobra era “papa-pinto”, porque ela gostava de comer os pintinhos das galinhas ainda dentro dos ovos chocados.
Bem, a casa era uma espécie de lingüiça, começava com o pé-direito, depois tinha a varanda (sala de aula), a sala de visitas, a despensa ou casa de farinha, um corredor com três quartos, um ao lado do outro. No corredor também havia uma espécie de “hall’, onde ficavam instalados os potes para tomar água. Não havia água potável e nem tampouco, água encanada! A água que tomávamos era a mesma água da lagoa. Na casa, havia mais uma sala de estar, mais um quarto, a cozinha com fogão à lenha e o banheiro, que era uma casinha do lado externo. Também do lado externo da casa ficavam o galinheiro, o chiqueiro, o curral e um galpão para guardar milho, feijão e mandioca. Havia uma plantação enorme de cactus! Esses serviam de alimento para os animais. Só que me disseram que na época de muita seca, as pessoas tomavam o líquido do cactus! Acho isso impressionante! Do lado oposto à plantação de cactus, ficavam o lago e as demais plantações. No quintal da casa, havia um enorme pé de primavera no qual eu brincava de casinha com a minha prima Iracy. Também havia um pé de açucena (planta da família das Amarílis). Essa açucena dava uma flor branca e azul, linda! Dizem que ali eram enterrados os cordões umbilicais dos meus irmãzinhos. Onze faleceram logo ao nascer! Eu sobrevivi para contar essa estória! O meu cordão umbilical também ficou no pé de açucena. Isso acontecia porque não havia maternidade na região. As crianças nasciam em casa mesmo, a enfermeira era uma parteira... As açucenas floriam mais ou menos no inverno e ficavam por um bom tempo. Depois só floriam novamente no ano seguinte. Incrível! Quem cuidava do jardim e das açucenas era uma das minhas irmãs, a Maria da Glória. Ela adora cuidar de plantas até hoje! Tanto é, que o jardim da sua casa é bem parecido com o jardim da Lagoa de Cima... Hoje da Lagoa de cima tenho apenas a foto do pé de umbu. A casa só existe na minha lembrança.
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2 comentários:
São lindas as crônicas, as histórias...fiquei até emocionada. Será que um dica consigo escrever a minha? Acho que não. Bjks
Querida Roseane,
Tenho certeza que irá escrever e será emocionante.
Grannnnde abraço !
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