Fernando Pessoa e Cecília Meireles: o encontro entre poesia e criança
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Alice Áurea Penteado Martha
Universidade Estadual de Maringá (Brasil)
Alice Áurea Penteado Martha
Universidade Estadual de Maringá (Brasil)
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Quando as crianças brincam
Quando as crianças brincam
Eu as oiço brincar,
Qualquer coisa em minha alma
Começa a se alegrar
E toda aquela infância
E toda aquela infância
Que não tive me vem,
Numa onda de alegria
Que não foi de ninguém.
[...]
(Pessoa, 1965, p.169)
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Considerações iniciais
Considerações iniciais
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Com este texto pretendemos considerar, a partir da leitura de poemas de Fernando Pessoa e de Cecília Meireles, os recursos de que se valem os poetas para promover a mediação entre a produção poética e a criança. Os poemas do autor de Mensagem, publicados em épocas e volumes diversos, foram recolhidos no volume Fernando Pessoa. Comboio, saudades, caracóis (FTD, 1988), organizado por João Alves das Neves e revelam uma face pouco conhecida do poeta; os da escritora brasileira, reunidos no livro Ou isto ou aquilo (Nova Fronteira, 1987), vieram a público em 1965 e são inteiramente dedicados aos leitores infantis. É preciso enfatizar que não se trata, como a princípio poder-se-ia supor, de um estudo sobre os modos como a infância de ambos é refletida em sua produção poética, tema, aliás, do artigo publicado por Francisco Cota Fernandes, Fernando Pessoa e Cecília Meireles: a poetização da infância, na revista do Centro de Estudos Pessoanos, Persona 5, de abril de 1981. Trata-se, isto sim, de observar como ambos, grandes poetas da nomeada “poesia para adultos”, não reduziram a qualidade estética de sua produção quando o intento era chegar até seus pequenos leitores. Ambos souberam, ao dirigir-se à criança, como revitalizar a palavra poética, concedendo-lhe tratamento mágico, sem desrespeitar-lhe o estatuto artístico.
Há um dado biográfico interessante dos poetas que não deve ser desprezado, pois pode ser relevante para compreender as imagens da infância em seus poemas, mesmo em uma leitura mais introdutória como esta, que é a herança cultural açoriana de ambos, advinda do fato de terem sido criados em ambientes prenhes de sensações e cadências dos Açores. Fernando Pessoa, filho de mãe açoriana, convive ainda com outros integrantes da linhagem materna; Cecília Meireles, órfã de pai e mãe, na mais tenra idade, é educada pela avó materna, D. Jacinta Garcia de Benevides, também de origem açoriana, como a própria escritora observa: “[...] minha avó, com quem fiquei, depois de perder minha mãe, sabia muitas coisas do folclore açoriano, e era muito mística, como todos os de S. Miguel”. (MEIRELES, 1977, p.61)
Embora não tenhamos a intenção de ressaltar significativo número de poemas para a infância na obra de Fernando Pessoa, como ocorre com a produção poética de Cecília Meireles, é interessante observarmos o modo como ambos promovem, em textos das obras mencionadas, por meio da tematização do cotidiano infantil e pela adoção de um ponto de vista valorizador do anticonvencional, tanto da linguagem quanto do recorte do real, o encontro entre a poesia e a criança. Devemos enfatizar, ainda, que os poetas, ao se inspirarem no cotidiano e ao assumirem a ingenuidade da ótica infantil, incorporaram, na poesia para crianças, os princípios da lírica contemporânea, segundo os quais os temas mais prosaicos podem revelar intenso lirismo.
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Com este texto pretendemos considerar, a partir da leitura de poemas de Fernando Pessoa e de Cecília Meireles, os recursos de que se valem os poetas para promover a mediação entre a produção poética e a criança. Os poemas do autor de Mensagem, publicados em épocas e volumes diversos, foram recolhidos no volume Fernando Pessoa. Comboio, saudades, caracóis (FTD, 1988), organizado por João Alves das Neves e revelam uma face pouco conhecida do poeta; os da escritora brasileira, reunidos no livro Ou isto ou aquilo (Nova Fronteira, 1987), vieram a público em 1965 e são inteiramente dedicados aos leitores infantis. É preciso enfatizar que não se trata, como a princípio poder-se-ia supor, de um estudo sobre os modos como a infância de ambos é refletida em sua produção poética, tema, aliás, do artigo publicado por Francisco Cota Fernandes, Fernando Pessoa e Cecília Meireles: a poetização da infância, na revista do Centro de Estudos Pessoanos, Persona 5, de abril de 1981. Trata-se, isto sim, de observar como ambos, grandes poetas da nomeada “poesia para adultos”, não reduziram a qualidade estética de sua produção quando o intento era chegar até seus pequenos leitores. Ambos souberam, ao dirigir-se à criança, como revitalizar a palavra poética, concedendo-lhe tratamento mágico, sem desrespeitar-lhe o estatuto artístico.
Há um dado biográfico interessante dos poetas que não deve ser desprezado, pois pode ser relevante para compreender as imagens da infância em seus poemas, mesmo em uma leitura mais introdutória como esta, que é a herança cultural açoriana de ambos, advinda do fato de terem sido criados em ambientes prenhes de sensações e cadências dos Açores. Fernando Pessoa, filho de mãe açoriana, convive ainda com outros integrantes da linhagem materna; Cecília Meireles, órfã de pai e mãe, na mais tenra idade, é educada pela avó materna, D. Jacinta Garcia de Benevides, também de origem açoriana, como a própria escritora observa: “[...] minha avó, com quem fiquei, depois de perder minha mãe, sabia muitas coisas do folclore açoriano, e era muito mística, como todos os de S. Miguel”. (MEIRELES, 1977, p.61)
Embora não tenhamos a intenção de ressaltar significativo número de poemas para a infância na obra de Fernando Pessoa, como ocorre com a produção poética de Cecília Meireles, é interessante observarmos o modo como ambos promovem, em textos das obras mencionadas, por meio da tematização do cotidiano infantil e pela adoção de um ponto de vista valorizador do anticonvencional, tanto da linguagem quanto do recorte do real, o encontro entre a poesia e a criança. Devemos enfatizar, ainda, que os poetas, ao se inspirarem no cotidiano e ao assumirem a ingenuidade da ótica infantil, incorporaram, na poesia para crianças, os princípios da lírica contemporânea, segundo os quais os temas mais prosaicos podem revelar intenso lirismo.
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